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14/09/2013

Entre o antes e o depois

Alguns dos últimos textos deste blog foram contaminados pela raiz daquilo que os fizeram nascer, uma quantidade um tanto acelerada de pensamentos emaranhados. Gênese e forma desdobraram-se em direções múltiplas, e cada desdobramento processou-se como novos feixes de pensamentos superpostos sobre a mesma coisa. Chamei "ideia" a essa coisa, esperando estar de fato dentro de um campo de possibilidades abertas. Quem sabe consigo apreender o gato de Schrödinger em sua condição binária.

O primeiro desdobramento andou em direção a esse gato - explico com as minhas próprias e provavelmente incompletas palavras. A proposta de Schrödinger constata que as ondas de matéria diferem das ondas eletromagnéticas e das ondas sonoras. Enquanto que a equação mecânica de Newton permite que localizemos com exatidão um objeto, a equação de Schrödinger permite que cheguemos a uma pluralidade provável de estados em que o objeto pode estar. Se não podemos observar o objeto diretamente, teremos de supor que o objeto, segundo Schrödinger, se encontra em todos os lugares em que a probabilidade diz que pode estar. Essa constatação faz emergir a ideia de superposição de estados da matéria. A experiência com o gato é uma metáfora perfeita. Coloca-se um gato e um vidro de veneno dentro de uma caixa opaca, à qual se liga um mecanismo de possibilidade de quebra ou não quebra desse vidro de veneno. Dependendo do funcionamento do ativador do mecanismo (e tudo isso muito bem explicado em http://www.youtube.com/watch?v=wRp2AEccks4&feature=youtu.be, num oferecimento do amigo Aléssio), o gato poderá estar vivo ou morto. Enquanto a caixa permanece fechada, e portanto a condição do gato alheia à minha consciência, esse gato está vivo e morto ao mesmo tempo. O meu olhar é que legitima de fato a morte ou a vida do gato. Consequentemente, o instrumento de quebra do estado de superposição (que é o estado quântico da matéria, aquele com o qual interagimos ao jogar dados, moedas, cartas) somos nós; os agentes do mecanismo da decoerência somos nós.

A catraca da bicicleta, nessa foto que meu filho Súria acaba de mandar da longínqua Brighton, mostra-me o mesmo. Tenho uma série de seis possibilidades distintas de encaixe para a corrente que não está lá; portanto, tenho como que seis correntes superpostas, invisíveis, diante dos meus olhos. Assim que uma delas se destacar das outras, e fizer uma das coroas rodar, eu passo a "saber" qual das coroas está em funcionamento. Até então, todas estavam no mesmo campo superposto de possibilidade de movimento. No momento em que a corrente "escolher" uma das coroas, quebra-se a tal da "magia quântica". O segredo deve ser permitir que a corrente mude outra vez de coroa, e se restabeleça o universo magístico no instante em que piscamos os olhos e a corrente definidora desaparece (o que me faz imediatamente pensar na Umbanda, pensamento que faço parar agora para desdobrar mais tarde; decoerência em ação).

O fato dessa foto chegar agora, justamente quando me detenho e escrevo sobre o universo da possibilidade múltipla (multiversos?), é quase que uma comprovação dessa mesma possibilidade múltipla. Como se a foto chegasse sob efeito da superposição de pensamentos que se processam, e que fazem com que o que penso aqui e o que ele pensa lá, que provavelmente nada tem a ver com o que penso aqui, possam encontrar-se num mesmo lugar e tempo. Mesmo que eu não saiba exatamente por que e em que momento essa foto saiu de seu computador para viajar até o meu, onde a vejo neste agora. E ainda que ambos, espaço e tempo, sejam virtuais, aqui dentro desta caixa iluminada na qual digito as palavras que exprimem o que penso.

Imagem: Súria Ribeiro